quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A música e suas mulheres extraordinárias

A música e suas mulheres extraordinárias

 

Ah, as vozes femininas. Grandes sopranos ou vozes pequenas, não importa. Canções sublimes, emocionantes, na voz de mulheres que cantam as cores, a vida, os amores, os dissabores, a política ou apenas as rosas. A arte que vem de suas melodias, letras ou interpretações é capaz de elevar a música ao status quo do sublime. Nunca do medíocre.

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Como não compartilhar da vontade absurda de sentir de Fiona Apple em Every Single Night? Como não ter olhos e coração marejados pela repetição de "I just want to feel everything"?

Com uma vida complexa e uma alma genuinamente artística, nascida em família musical, a cantora americana carrega o peso da violência sexual sofrida, além de outros traumas, que se transformam em arte legítima. Em seu disco de estreia, uma canção, Sullen Girl, já mostrava a complexidade da alma de Fiona.

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Madonna, que reina absoluta em pistas de dança do mundo inteiro, controversa, comercial, tem uma vida que oscila entre a aclamação e a vaia, entre a adoração e o desprezo. Poucas artistas recebem defesas e ataques tão apaixonados como a eterna Material Girl. A música, inclusive, celebra a faceta provocadora de Madge, que faz uma arte afeita às volúpias, à luxúria, à carne, ao sexo e ao poder. Mesmo depois de sua conversão à Cabala, dos filhos e de ter se tornado escritora de livros infantis, Madonna continua fazendo da música um intrumento de choque. Um extraordinário instrumento.

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Maior soprano da história, Maria Callas é considerada a mais controversa artista do universo lírico. Conhecida por frequentes problemas com colegas, a artista tinha um temperamento tão forte quanto a força das personagens que costumava interpretar. Exagerada, buscava uma perfeição que beirava o caricato, mas que, da mesma maneira, lhe alçava ao adjetivo de "magnífica". Como Medea ou Gioconda, até hoje não apareceu uma interpréte que lhe faça sombra. Anna Netrebko, sem a parte das polêmicas, tem tentado (e conquistado) o posto de musa contemporânea do lírico, mas não existiu ainda e dificilmente surgirá alguém como Callas.

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"Prefiro a fama de esquisita à de ninfa sexy". Assim, minha cantora preferida, Björk, traçou um caminho musical à contramão do esperado. A islandesa, que levou um Prêmio Nobel da Música em 2010, se mostra unusual desde os 5 anos de idade, quando começou a cantar. Seu primeiro disco veio aos 12 anos de idade, Björk, incomum até mesmo seus maiores fãs. Diferente de outras cantoras, Björk tem uma vida pessoal discreta e sem (muitos) rompantes ou escândalos a se mesclarem à arte. Björk transita do rock ao jazz experimental, passando pelo universo eletrônico, inovando, com sucesso, a cada nova obra.

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Maior representante do estilo Chanson francês, Edith Piaf, de vida trágica, cantava de forma autobiográfica. Dizem que nasceu duas vezes na rua - dizem que nasceu numa calçada de Belleville - já que foi descoberta enquanto cantava pelas ruas de Pigalle, em Paris. Piaf foi mãe sem ser mãe, foi acusada de cumplicidade em crimes, sempre foi considerada feia (e era baixinha), teve amores controversos e levou cerca de dez anos para gravar sua primeira grande canção, La vie em rose. Dona da maior voz francesa de todos os tempos, Edith Piaf também fez incursões no cinema desde o início de sua carreira. Seus dramas a tornaram uma mulher triste, mas movida, até seus últimos dias, pela paixão e os excessos, de amores e morfina.

Des nuits d'amour à plus finir
Un grand bonheur qui prend sa place
Des ennuis des chagrins s'effacent
Heureux, heureux à mourir.

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Aretha Franklin foi eleita a maior cantora de todos os tempos pela Rolling Stone. A negra, gospel e rainha do soul tem uma voz que é considerada uma maravilha natural e patrimônio dos Estados Unidos. Na posse de Barack Obama, primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Aretha Franklin cantou "My Country, 'Tis of Thee", uma das mais significativas canções sobre a liberdade, emocionando o mundo inteiro. Aretha merece os títulos, todos grandiosos, que carrega.

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Miss Peaches do R&B, Etta James, que morreu vítima de uma leucemia em janeiro deste ano, é a própria encarnação do título deste post, uma das mais extraordinárias mulheres na história da música. Viveu, como muitas destas musas, uma vida de excessos de drogas e romances que tornaram sua carreira instável. Instabilidade que não a impediu de gravar canções emocionantes, como At Last, título também do seu primeiro disco, e Blue Gardenia.

Beyoncé, na morte de Etta James, depôs:

"Etta James foi uma das maiores cantoras de todos os tempos. Eu sou muito sortuda em ter conhecido uma rainha. As contribuições dela para a música vão durar para sempre. Interpretá-la no cinema [Cadillac Records] me ensinou muito sobre mim mesma, e cantar sua música me inspirou a ser uma artista mais forte. Quando, sem esforço, ela abria a boca, era possível ouvir sua dor e triunfo."

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Pra mim, é impossível deixar Janis Joplin fora desta lista. A cantora foi a rainha do rock da minha adolescência, eram suas músicas que eu cantava nas rodinhas de violão e bebida barata, o símbolo da minha rebeldia, 30 anos após a sua. Janis Joplin viveu uma vida sem cortes, em versão do diretor, peitou a sociedade, atribuiu significado à vida sem amarras, viveu a mil e morreu aos 27 anos de idade, de overdose, ironicamente aprisionada pelos seus combustíveis de vida: o sexo, as drogas, o álcool e o rock'n'roll. Janis tinha consciência de que sua postura perante a vida a levaria embora mais cedo, mas assumiu esse risco.

O que foi sua maior canção, Piece of my heart.

 

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Nina Simone fugiu dos pais, pastores, pra cantar blues nos cabarés de New York. Sua vida de peitaços e transgressões começava aí. Ativista civil contra o racismo e a violência doméstica (era casada um policial que a espancava com frequência), interpretou canções que sempre foram manifestos políticos. Sua voz rouca e emocionada foi porta-voz de uma vida com causa e sentido. Nina Simone foi uma mulher extraordinária, de voz forte, de voz embargada de histórias. Diva da celebração.

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Gosto de pensar em Ella Fitzgerald como a mais pura das vozes femininas do século XX. Impecável, afinada, de alcance absoluto, a jazzista até hoje recebe tributos de artistas do mundo inteiro, pela sua capacidade de falar de amor encantadoramente. Ella, órfã, abandonou a escola, foi presa, passou por asilos e reformatórios e poderia ter se tornado uma sobrevivente, mas quando descobriu a arte, sua redenção foi absoluta. De poucas palavras, era a música a única a conseguir expiar sua alma doce. Parceira de Louis Armstrong, Quincy Jones, Dizzy Gillespie, Duke Ellington e todos os grandes nomes do jazz, Ella Fitzgerald foi primeira dama da sua vida.

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Patti Smith, a poetisa do punk, é um dos mais incríveis fôlegos da história do rock and roll. Feminista, pensadora e ousada, a cantora americana foi criada entre o ateísmo e teorias religiosas esdrúxulas. Abandonou cedo a escola pra criar uma história de desafios e criações geniais, em parceria com os mais autênticos artistas com os quais conviveu em toda sua vida. Aos 65 anos, Patti Smith ainda mostra uma força e uma incrível alma roqueira, mesmo depois de tantas perdas, acidentes, isolamentos e recomeços. "About a Boy", em homenagem a Kurt Cobain é de uma emoção inexplicável. Aliás, essa mulher é absurdamente extraordinária. Na minha lista de leituras está Só Garotos, sua biografia. Atualmente, Patti anda mais política do que nunca e não tem permanecido calada sob quaisquer assuntos e causas, especialmente em seu país.

 

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Billie Holiday, ou Lady Day, é uma das maiores vozes femininas do jazz. É impossível não se dobrar de ternura ao ouvi-la. Billie, que desde cedo conviveu com as violências da pobreza e a violação de sua própria sexualidade, foi sexualmente abusada aos 10 anos e aos quatorze, já se prostituía. O canto, alguns anos mais tarde, foi sua salvação. Ao menos da miséria social e econômica, porque Billie Holiday nunca se salvou dos seus traumas. O álcool e as drogas lhe acompanharam e levaram dessa vida.

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Por fim, acaba de completar um ano da morte da britânica Amy Winehouse, aquela que me emocionou em inúmeros momentos nessa sua breve vida. Amy, que aos 27 anos, foi derrubada pelos excessos, deixando dois discos como herança musical, "Frank" e "Back to Black". Na música, na moda e na vida, Amy Winehouse, brevíssima, definitivamente se tornou história, ícone e referência, de Adele a Lady Gaga.

As extraordinárias mulheres da música são um sem número. De vozes e almas distintas, de nacionalidades diversas, de inúmeros estilos, de todos os timbres, elas são apenas elas.

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