Sua voz é de um timbre raro e segue canções incongruentes. Ainda assim permanece familiar, encanta com alguma coisa inexplicável, perturba. A norueguesa Ane Brun tem as notas certas que nos fazem mergulhar em alguma nova existência de nossas próprias e íntimas histórias.
Aos primeiros sons de “The Treehouse Song”, sem aviso, um mundo doce e cheio de brisa aparece. É como se o botão de play tivesse o poder de te transportar para um dia mágico; meio clichê de filme alternativo, mas mágico. Um cão corre na areia, um carro vermelho parado, um amante abandonado, um aneurisma descoberto, um fim doce qualquer. Só algumas descrições e metáforas meio bobas parecem suficiente para falar do paixão fervente e austera que começa a se desenrolar a partir de então.
O charme nórdico é inegável e, de tempos em tempos, somos brindados com uma nova leva de músicos incríveis que se forma naquela região gelada da Europa. Destes, poucos são descobertos e ganham o mundo mas, quando isso acontece, os efeitos são sempre arrebatadores. A-Ha, Björk e o próprio Sugababes, os grupo Sigur Ros Röyksopp e The Hives, cada qual em seu estilo, atestam a força sonora de países como a Dinamarca e a Islândia.
Ane Brunvoll é um exemplo desses fenômenos que acontecem. Nascida na Noruega, após três discos (sendo o primeiro, Spending Time with Morgan, considerado até o momento como sua obra prima) e inúmeros EP’s oficiais e extra oficiais; Changing the Seasons, de 2008, está sendo o álbum que lhe apresenta ao resto do mundo. Foi a partir dele que conheci os encantos que vão desde as batidinhas da primeira faixa “The Three house song” até a singela valsa “Armour” que parece saída de um conto de fadas. Desde então estou procurando como falar sobre isso sem usar descrições ou metáforas bobas. Falhei e me sinto satisfeita por isso.
Nas audições, a sensação de que nenhum elemento musical está ali ao acaso é permanente. Os pequenos detalhes que parecem engrandecer cada parte, que conseguem transformar cada faixa em um épico íntimo, uma lenda pessoal. O resultado faz parte de uma esperta habilidade de Ane Brun para articular apelos familiares com um estilo incongruente e raro. O conforto do pop está presente em tudo, mas não disfarça o folk sombrio que remete a um soturno Nick Drake, e a um toque de Piaf que gosta de exibir nas suas tremulações de voz. E na filosofia das canções tudo é brutal e gentilmente congelado nas desilusões do amor e as alucinações do abandono; porque a vida sempre separa, mas sempre - e isso é estranho, é fascinante - sobrevivemos. Às vezes não tão inteiros quanto antes.
As composições e elementos musicais dizem tanto quanto as palavras cantadas e cada música só quer contar da beleza que há no recolhimento da solidão. Ela dá as más notícias de forma doce e hipnótica, e por isso nunca triste. Impossível resistir a essa fantástica e melancólica artista. Para os destemidos, fica a música "The Puzzle", do disco "Changing the Seasons".
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