As Pessoas Sensíveis (Sophia de Mello Breyner Andresen)         
As pessoas sensíveis não são capazes    
De matar galinhas    
Porém são capazes    
De comer galinhas    
O dinheiro cheira a pobre e cheira    
À roupa do seu corpo    
Aquela roupa    
Que depois da chuva secou sobre o corpo    
Porque não tinham outra    
O dinheiro cheira a pobre e cheira    
A roupa    
Que depois do suor não foi lavada    
Porque não tinham outra    
"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"    
Assim nos foi imposto    
E não:    
"Com o suor dos outros ganharás o pão".    
Ó vendilhões do templo    
Ó construtores    
Das grandes estátuas balofas e pesadas    
Ó cheios de devoção e de proveito    
Perdoai-lhes Senhor    
Porque eles sabem o que fazem.
   
Prece ao Mar (Else Sant’Anna Brum)       
Se tu pudesses, mar, se tu pudesses    
Levar-me contigo para onde vais,    
Sem em tuas ondas me quisesses,    
Eu iria pra não voltar jamais!    
Penso que além de ti, na solidão,    
Haverá refrigério para a alma,    
E este meu triste e pobre coração    
Terá um pouco de alegria e calma.    
Porque talvez, além de ti, ó mar,    
Não exista ninguém aqui da terra    
Nem possibilidade de amar.    
Leva-me, é o que te peço em minhas preces    
Pois uma triste história a minha vida encerra.    
Levar-me, ó mar amigo, se pudesses!
   
Lágrimas de Areia (Agamenon Troyan)     
Lá estava ela, triste e taciturna    
Testemunha de efêmeros conflitos    
Com um olhar perdido no tempo,    
Não exigia nada em troca    
A não ser um pouco de atenção.    
Sentia-se solitária; oca.    
Os homens admiravam-na    
Pelos seus contornos    
As crianças, em sua eterna plenitude,    
Admiravam-na muito mais além...    
... Mais humana!    
Dessa profunda melancolia    
Lágrimas surgiram.    
Elas não molhavam o seu rosto    
Mas secavam o seu coração,    
O poço da sua alma,    
Aumentando cada vez mais    
A sua sede.    
E lá ela permaneceu; estática, paralisada!    
Esperando que o vento do norte a levasse    
Para bem longe dali...    
O dia começou a desfalecer    
Seu coração, outrora seco e vazio,    
Agora pulsava em desenfreada arritmia.    
Desespero!    
A maré estava subindo...    
Em breve voltaria a ser o que era:    
Um simples grão de areia.    
Quiçá um dia levado pelo vento,    
Quiçá um dia!     
Em um porto seguro.
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